O presidente da Associação Industrial de Angola (AIA), José Severino, considera que os gastos do país com salários são “insuportáveis e inadequados” e defendeu uma redução em 30% até Junho do próximo ano. “Isto não é para nós, pois não?”, perguntam as zungueiras e os 20 milhões de pobres.
Segundo José Severino, este é um dos problemas que se coloca à gestão dos recursos cambiais: “Não é aceitável que este país gaste 2.400 milhões de dólares (2.178 milhões de euros) em transferências de salários, é inaceitável, insuportável e inadequado”, criticou, apelando a que os gastos sejam reduzidos em 30% até Junho do próximo ano.
Um corte que, salientou, deve ser feito não só ao nível da função pública, mas também em muitas das empresas angolanas: “o pessoal tem de ser reduzido, há abusos”. Com esta explicação, o pessoal que às segundas, quartas e sextas passa fome, e às terças, quintas e sábados nada tem para comer até arrota com mais… prazer.
O presidente da AIA sugeriu que devem ser feitos vários cortes na “má despesa” para enfrentar a crise económica. Está bem visto, reconheça-se. Se o exemplo for feito de cima para baixo, sem excepções, o resultado será positivo.
“Temos grandes desafios pela frente e temos de ter alguma perspicácia, inteligência e alguma audácia para não ver uma situação, que já é difícil, complicar-se”, afirmou. Isto, é claro, significa uma revolução que o regime nunca irá permitir, desde logo porque está no seu ADN trabalhar para que os que têm milhões (os seus) tenham ainda mais milhões, enquanto os muitos milhões (que não são seus) que têm pouco – ou nada – passem a ter ainda menos.
José Severino apontou “imoralidades” como os gastos de 400 milhões de dólares (363 milhões de euros) em importações de carnes, que poderiam ser produzidas em Angola, e defendeu a imposição de “um rácio para os grandes importadores” em alguns sectores, nomeadamente o sector avícola. Por outras palavras, bastava que desde 1975 o país tivesse (embora do mesmo partido, MPLA) alguns governos minimamente competentes e capazes de transformar o reino num Estado de Direito.
José Severino disse também que é preciso combater o contrabando de gasóleo onde são desperdiçados outros 400 milhões de dólares anuais (363 milhões de euros). Pois. É caso para perguntar: se Angola está no estado em que está ao fim de 44 anos de governação do MPLA, não seria mais do que suficiente mudar de partido? Seria, mas quem só tem a força da razão não consegue derrotar quem só tem a razão da força.
“O país não pode suportar isso. Enquanto nós tivermos essa má despesa, dificilmente as empresas vão ter acesso às divisas de que precisam. Mesmo na importação de bens de consumo são 200 milhões de dólares por mês (182 milhões de euros), coisas que poderíamos produzir”, reforçou, sublinhando que “já se podem encontrar matérias-primas nacionais” e deve haver também uma aposta na reciclagem.
O responsável da AIA sugeriu também medidas para melhorar a produtividade, como por exemplo o alargamento do horário dos bancos. É tudo simples, bastaria o governo (este e os outros) saberem alguma coisa sobre boa governação. Quanto à substituição das importações pela produção nacional bastaria, sem complexos, ver o que os portugueses cá fizeram antes de terem vendido o país ao MPLA.
“Os bancos fecham às 14:30, não trabalham ao sábado, estão no conforto. Não podem”, salientou José Severino, acrescentando que é preciso “governar o país na crise, e não governar o país como se estivesse tudo bem”. Defende, por isso, que não devem ser tomadas medidas precipitadas, mas sim “medidas peremptórias”.
Questionado sobre o impacto das medidas de política monetária recentemente adoptadas pelo Banco Nacional de Angola, que incluíram a liberalização da taxa de câmbio, removendo a margem de 2% imposta à comercialização de divisas, José Severino espera que “com este choque” se consiga alguma estabilização.
também a taxa do Imposto Especial de Consumo (IEC) no sector das bebidas, defendendo que deve ser reduzido para 7%, cerca de metade da actual (16%).
“É preciso fazer contenção de preços e isso faz-se reduzindo os impostos, assinalou, defendendo que 7% seria também o valor mais adequado também para o IVA, que entrou em vigor a 1 de Outubro.
José Severino pediu também que o IVA relativo às matérias-primas dos produtos da cesta básica (composta por 54 bens, maioritariamente alimentares), seja devolvido em 8 dias, para evitar que o capital fique imobilizado, impossibilitando a compra de matéria-prima.
Também é preciso “pôr dinheiro no campo”, sugeriu, propondo mais apoios aos agricultores através de microcrédito e acesso mais fácil ao crédito à habitação, para criar mercado de trabalho.
“Não há consumo porque não há emprego e podemos criar emprego com a construção civil”, concluiu. Embora seja uma radiografia muito exacta, são verdades de La Palice que, por tão óbvias, escapam à genialidade anã de um partido e de um governo que se julgam gigantes mas que mais não são do que pigmeus.
Folha 8 com Lusa